terça-feira, 28 de abril de 2009

Expressionismo Fractal Abstrato

"Nuvens não são esferas, montanhas não são cones, continentes não são círculos, o som do trovão não é contínuo e nem o relampago viaja em linha reta." - Benoît Mandelbrot

"A geometria fractal fará com que você veja tudo de uma forma diferente. Além disso, há perigos na leitura. Você arrisca perder a sua visão de infância sobre nuvens, florestas, flores, galáxias, folhas, plumas, pedras, montanhas, torrentes d’água, tapetes, ladrilhos e muito mais. A sua interpretação sobre estas coisas, nunca mais será exatamente a mesma.” - Michael F. Barnsley

"Não há, na realidade, nem estilo belo, nem desenho belo, nem cor bela. Existe apenas uma única beleza, a beleza da verdade que se revela. Quando uma verdade, uma idéia profunda ou um sentimento forte, explode numa obra literária ou artística, é óbvio que o estilo, a cor e o desenho são excelentes. Mas eles só possuem essa qualidade pelo reflexo da verdade." - Auguste Rodin




INTRODUÇÃO AOS FRACTAIS


Imagine o que significa ter em seu poder um instrumento matemático de restauração do seu ser, algo que acaba com depressão, dá ânimo e energia, faz aflorar memórias perdidas, restaura o bem estar e que faz você limpar completamente sua mente. Pois bem, imaginou? Isso existe...

Mas, o que são fractais?

Fractais são, resumidamente, gráficos de uma equação matemática que são ligados ponto a ponto por repetidas aplicações de uma mesma fórmula.

Segundo o velho Euclides, matemático grego que viveu mais de dois milênios atrás, existem figuras que não têm dimensão, ou melhor, têm dimensão ZERO. É o caso dos pontos, como este ponto final. Uma linha, por sua vez - considerada a distância entre dois pontos quaisquer -, é algo com uma única dimensão. Já uma superfície plana, como a tela de uma pintura, de acordo com a geometria euclidiana, tem duas dimensões. Pois, para conhecer qual a sua área, é necessário multiplicar dois números – a medida do comprimento pelo da largura. Do mesmo modo, um bloco possui três dimensões, porque precisamos multiplicar três números (comprimento, largura e altura) para saber qual o seu volume. Euclides estava no caminho certo, mas não resolveu todo o problema. Os contornos das montanhas, a superfície dos pulmões humanos, a trajetória das gotículas de água quando penetram na terra - existe uma infinidade de fenômenos na natureza que não podem ser descritos por essa geometria linear euclidiana. É preciso apelar para complicados cálculos que resultam nas chamadas dimensões fracionárias - como a dimensão 0,5, por exemplo, típica de um objeto que é mais do que um simples ponto com dimensão zero, porém menos do que uma linha com dimensão 1. Só a chamada geometria dos fractais consegue descrevê-lo.

O estudo dos fractais está ligado à teoria do caos, que busca padrões organizados de comportamento dentro de um sistema aparentemente aleatório. Na mitologia grega, Caos era o estado não-organizado, ou o Nada, de onde todas as coisas surgiam. Mas não era apenas o mero vácuo e sim o estado de escuridão e nebulosidade infinita. De acordo com a Teogonia de Hesiodo, o Caos precedeu a origem, não só do mundo, mas também dos deuses.. Hoje em dia - com o desenvolvimento da Matemática Pura - a Teoria do Caos surgiu para compreender as flutuações erráticas e irregulares da natureza, variações dos mercados internacionais de capitais e padrões da atmosfera terrestre. Sistemas de comportamento caótico são encontrados em muitos campos da ciência e engenharia e são estudados, pois muitas vezes são achados padrões que mostram uma estrutura ordenada fractalmente nesse sistema. Uma característica de um sistema caótico é que ele sempre mostra "sensibilidade às condições iniciais", isto é, qualquer perturbação no estado inicial do sistema, não importando quão pequena seja, levará rapidamente a uma grande diferença no estado final, fazendo com que a previsão do futuro a longo prazo torne-se muito difícil. Porém, compreendendo o comportamento caótico, muitas vezes é possível entender como o sistema se comportará, probabilisticamente, como um todo.

Essa nova área das ciências matemáticas vem tendo uma enorme aplicação. Para os biólogos, ajuda a compreender o crescimento das plantas. Para os físicos, possibilita o estudo de superfícies intrincadas e os padrões de difusão de líquidos sobre ela. Para os médicos, dá uma nova visão da anatomia interna do corpo. Enfim, não faltam exemplos. Um dos mais belos - e, sem dúvida, o mais colorido - é o uso dos fractais na arte. Quando os computadores são alimentados com equações, eles criam magníficos desenhos abstratos. É o que você poderá perceber nas obras da MOSTRA FRACTAL SENSATIONS do Dr. Clandestino.

"O que mais me fascina é procurar novos padrões de um mesmo fractal para construir as minhas imagens", diz o artista. “Isso porque quanto mais você se aproxima de um fractal, mais detalhes você consegue enxergar nele. Parece não ter fim - é uma visão do infinito. Desse modo, ao ampliarmos determinada área do desenho dezenas ou centenas de vezes - sempre se observa padrões diferentes.”

Diferentes, porém parecidos. Pois não basta ter dimensão fracionária para ser um fractal. É preciso que o objeto seja auto-semelhante: suas partes devem se parecer muito entre si e representar o todo. Ou seja, um fractal pode ser comparado a um brócolis ou couve-flor - se alguém cortar um pedaço dela, verá que ele se assemelha a verdura inteira. A terceira e última característica de um fractal é ser fruto de um processo iterativo. No jargão dos matemáticos, isso significa repetir uma fórmula inúmeras vezes. É dessa repetição que surge a imagem. A ciência dos fractais apresenta estruturas geométricas de grande complexidade e beleza infinita, ligadas às formas da natureza, ao desenvolvimento da vida e à própria compreensão do universo. São imagens de objetos abstratos que possuem o caráter de onipresença por terem as características do todo infinitamente multiplicadas dentro de cada parte, escapando assim, da compreensão em sua totalidade pela mente humana.

A arte com fractais pode ser um caminho para os matemáticos explicarem as suas idéias. Isso é o que almeja o artista.


OS FRACTAIS


Uma primeira definição matemática, pelo próprio Mandelbrot, diz: - "Um conjunto é dito Fractal se a dimensão Hausdorff-Besicovitch deste conjunto for maior do que sua dimensão topológica". No decorrer do tempo ficou claro que esta definição era muito restritiva embora tenha motivações pertinentes. Uma definição mais simples é esta: "Fractais são objetos gerados pela repetição de um mesmo processo recursivo, apresentando auto-semelhança e complexidade infinita." Essa geometria, nada convencional, tem raízes remontando ao século XIX e algumas indicações neste sentido vêm de muito antes na Grécia Antiga, Índia, China, entre outros. Porém, somente há poucos anos vem se consolidando com o desenvolvimento dos computadores e o auxílio de novas teorias nas áreas da física, biologia, astronomia e matemática. O termo "fractal" foi criado em 1975 pelo pesquisador Benoît Mandelbrot, o "pai dos fractais". Diferentes definições de Fractais surgiram com o aprimoramento de sua teoria. A noção que serve de fio condutor foi introduzida por Benoît Mandelbrot através do neologismo "Fractal", que surgiu do adjetivo latino fractus, que significa "irregular" ou "quebrado".

Os fractais podem apresentar uma infinidade de formas diferentes, não existindo uma aparência consensual. Contudo, existem duas características muito freqüentes nesta geometria:

- Complexidade Infinita: É uma propriedade dos fractais que significa que nunca conseguiremos representá-los completamente, pois a quantidade de detalhes é infinita. Sempre existirão reentrâncias e saliências cada vez menores.

- Auto-similaridade: Um fractal costuma apresentar cópias aproximadas de si mesmo em seu interior. Um pequeno pedaço é similar ao todo. Visto em diferentes escalas a imagem de um fractal parece similar. Em conseqüência da auto-similaridade, quando vistas através de uma lente de aumento, as diferentes partes de um fractal se mostram semelhantes à forma como um todo.

A Curva de Koch é um exemplo geométrico da construção de um fractal. Um mesmo procedimento é aplicado diversas vezes sobre um objeto simples, gerando uma imagem complexa. Cada pedaço da linha foi dividido em pedaços menores idênticos ao pedaço original, cada um sendo n vezes menor que o tamanho original. Assim, usando um novo conceito de dimensão, os matemáticos calcularam a dimensão fractal deste objeto como sendo: 1,26.

É surpreendente como pesados e complexos cálculos matemáticos, só possíveis com o uso de computadores, tenham sido a solução encontrada para a representação das formas da natureza, que aparentemente nada tem a ver com fórmulas matemáticas, e que pudesse haver uma ordem no caos, “uma ordem da desordem”. Mandelbrot observa que os objetos fractais nos levam a travar conhecimento com problemas científicos antigos, belos e difíceis. O interesse estético suscitado pelas formas fractais parece indicar a existência de “uma estética matemática”, a qual Mandelbrot confessa temer que possa ter apenas um valor estético ou até mesmo apenas “cosmético”. De uma maneira geral, um “... objeto fractal é qualquer coisa cuja forma seja extremamente irregular, extremamente interrompida ou descontínua, um objeto físico (natural ou artificial), que mostra intuitivamente uma forma fractal”.

As formas fractais são freqüentes na natureza, como a do recorte de uma costa, o perfil dos flocos de neve, os contornos de um rio ou de uma nuvem, etc.. Sempre se considerou a forma desses objetos como não previsível, descritível ou calculável, devida ao acaso, de acordo com as noções da geometria euclidiana tradicional, que não pareciam suficientemente adequadas para tais formas, especialmente por não contemplarem as dimensões fracionadas do número. Na verdade Mandelbrot não cria, mas reformula uma teoria geométrica que se adapte à descrição dos objetos fractais. Tais formas, pela sua estranha e irregular configuração, apresentam-se como objetos diferentes, causadores de inquietação e surpresa, gerando ao mesmo tempo admiração e desconforto visual.


Nos acostumamos a pensar na dimensão em termos de unidade: zero para o ponto, um para a linha, dois para a superfície e três para o volume. E, assim, a exigência de dimensões não inteiras, correspondente a frações, seria um caso de “monstruosidade” geométrica: as dimensões fractais.


O APELO ESTÉTICO DOS FRACTAIS


Os fractais são também formas geométricas abstratas de uma beleza incrível, com padrões complexos que se repetem infinitamente, mesmo limitados a uma área finita. Todas estas formas e padrões possuem algumas características comuns e há uma curiosa e interessante relação entre estes objetos e aqueles encontrados na natureza. Um fractal é gerado a partir de uma fórmula matemática, muitas vezes simples, mas que, aplicada de forma interativa, produz resultados fascinantes e impressionantes. São formas que se caracterizam por repetir um determinado padrão com ligeiras e constantes variações (auto-similaridade). Podem ser facilmente identificadas na natureza em qualquer estrutura cujas ramificações sejam variações de uma mesma forma básica. Essas estruturas matemáticas, que pertencem à ciência do século XX, são belas e verdadeiras. Parecem, porém, estranhos como, de resto, alguma da arte desse século. O mundo fractal exemplificado no conjunto de Mandelbrot lembra-nos as estranhas pinturas de Vladimir Kandinsky ou de Jackson Pollock mais do que as clássicas esculturas dos gregos ou dos renascentistas. Algumas teorias da informação estética consideram a surpresa como uma marca do génio numa obra de arte. Esta obra deve ser suficientemente equilibrada para transmitir uma impressão de harmonia, mas também deve ser suficientemente provocadora para atrair a atenção do público. Um objecto de arte deve ter uma proporção, mas deve também ter um elemento inusitado que desfigure a proporção. Muitas obras de arte moderna, inspiradas nos fractais, constituem bons exemplos desta asserção.

Adjetivos como organizado, estável, integrado, claridade formal, belo, brilhante, ornamental, precioso, tem sido usado freqüentemente por teóricos e filósofos, na apreciação de objetos, naturais ou não. “Belo” é, entretanto, aquele que mais tem recebido a ênfase dos filósofos desde os tempos de Platão. Alguns filósofos, seguindo Kant, têm identificado julgamentos estéticos puros com critérios de beleza. Independentemente de que julgamentos de beleza, conforme Hume, “sejam julgamentos de gosto”, o que os torna essencialmente subjetivos e, portanto, não possa existir o que poderia se chamar “um padrão de gosto”, é sempre interessante retornar às diferentes teorias da Beleza. Para Kant, a Beleza é uma questão de gosto, pois gosto é “a faculdade de julgar o belo”. Independentes de conceitos, esses julgamentos seriam o que ele chama de “estéticos”, opostos a “julgamentos lógicos”, os quais seriam “julgamentos objetivos”, que atribuiriam determinadas propriedades aos objetos. Os “julgamentos estéticos” seriam subjetivos, cuja base determinante seria o prazer ou a dor, satisfação ou insatisfação que proporcionam. E, para ser um “julgamento estético puro”, afirma ainda Kant, este precisa ser, antes de tudo “desinteressado”. Sendo que desinteressado é aquele prazer que qualquer pessoa pode ser capaz de sentir; então, quando se diz que algo é “belo”, ele reitera, se fala com “uma voz universal”. Tolstoi, em "What is Art?", considera que, no aspecto subjetivo, chamamos “belo” aquilo que nos fornece uma determinada forma de prazer. No aspecto objetivo, dizemos que é “belo” algo absolutamente perfeito. A perfeição absoluta também nos causa uma espécie de prazer, mas é apenas a concepção subjetiva diferentemente expressada.

O Belo clássico grego tinha exigências bem precisas quanto às proporções e quanto às relações das proporções entre a parte e o todo. Aplicadas à construção da figura humana, essas regras se referiam mesmo à idade em que a figura era representada (nem velho, nem criança), bem como à postura e atitudes, pois nada poderia perturbar o “perfeito equilíbrio”, denominado sofrosine. Este perfeito equilíbrio era observado tanto em relação à forma com suas proporções perfeitas de acordo com os cânones prescritos, o absoluto domínio técnico, quanto à representação do domínio emocional do representado. No período clássico grego as emoções não eram representadas, pois romperiam a serenidade ideal. No renascimento voltamos a encontrar a preocupação com a representação da Beleza em grandes artistas e teóricos, como Luca Pacioli, que em 1509 publica “De Divina Proporcione”, e o célebre “Tratado das Proporções” de Albrecht Dürer, evidenciando a procura por uma definição formal da beleza e as regras para alcançá-la. Luca Pacioli é influenciado pelas idéias de Piero Della Francesca, que no começo de século XVI é obcecado pela Matemática, que aplica na construção de suas obras. Dürer também deseja dar à sua arte uma Lei Matemática, e inicia a elaboração matemática das figuras, embora reconhecendo que as leis da proporção permitem apenas aproximar-se à “beleza”, pois somente a inteligência divina poderia conhecer a perfeição absoluta. Exaltando a “idéia do belo”, Platão não afirma que ele seja a essência da arte, mas ao contrário, que a beleza absoluta não poderia estar senão nas figuras geométricas, nas cores e nos sons puros: a beleza é uma abstração. A obra de arte, ele precisa na República, não é senão um simulacro, uma imitação da realidade ideal, o que seria condenável do ponto de vista ontológico. Platão, identificando a prática da arte com a criação de aparências, propõe uma poderosa e devastadora metáfora, que aponta para a inércia e a fraqueza da arte como instrumento de conhecimento. Aristóteles, entretanto, objetiva a idéia de Platão, considerando que na obra de arte pode ser distinguido o prazer estético do prazer sensual...

Num salto de alguns milhares de anos, quando a tecnologia e a máquina se tornam agentes de instauração estética, pensemos a Geometria Ffractal como objeto de consideração e reflexão sobre a beleza. Em 1986, uma exposição organizada por dois alemães, H. Otto Teitgen e P.H. Ritter, intitulada “The Beauty of Fractals”, percorria a Europa e encantava o olho contemporâneo, com os objetos fractals obtidos por meio de computador e que revelavam a beleza fascinante destas formas, desses “polígonos teragônicos” (com elevadíssimo numero de lados). Numa época em que nos deparamos com imagens sem referente (o fractal é de uma auto- referencialidade inata), que provém de uma origem numérica, de simulações matemáticas, que são uma série de operações fundamentalmente digitais, nosso universo de indagações e investigações vê-se projetado em considerações complexas e instigantes, de uma ética e ecologia do domínio da imagem eletrônica, um universo inebriante construído de luzes, cores, sons ainda por decifrar. Uma quase realidade se instaura, à qual Fausto entitulamos de Sombras Sintéticas. Numa sociedade da imagem, como a que vivemos, num universo constituído de ficção e imagens, é evidente que a imagem tecnológica e os meios de comunicação de massa são criadores de um pseudo-ambiente, de uma pseudo-realidade, sinteticamente gerada. Baudrillard, por sua vez, se debruça sobre o tema do simulacro como o espaço do signo que dissolve o original, que cria o ícone artificial, que destrói a referencialidade ontológica da realidade. Assim o virtual transforma a noção de mundo e apaga a imagem que dele fazemos nos colocando face a face com um cosmo sem referências.

Reconheço três propriedades para os objetos fractais:

- primeira: caráter casual, sendo o acaso definido no cálculo das probabilidades, artificialmente introduzido nos sistemas simulados;

- segunda: caráter escalante, o fato de terem uma forma ou estrutura que se repete sempre quase igual, tanto no conjunto como em suas parte, em qualquer escala;

- terceira: caráter teragônico, pois os objetos fractals têm forma poligonal, de elevadíssimo numero de lados, “monstruosa”.

Um terágono é um polígono de número incontável de lados. Sua etimologia grega nos revela o prefixo teras, que significa monstro, e o prefixo numérico tera, que designa, no sistema decimal, o número 10, e é o último prefixo verbal existente para significar uma potência de dez. Tal classificação sugere essa natureza “monstruosa”, incomensurável, desproporcionada, exagerada, para os fractais. Fractais são, portanto monstros particulares, de elevadíssima fragmentação figurativa, monstros dotados de ritmo e repetitividade escalar, não obstante a irregularidade, monstros cuja forma se deve ao acaso, mas só como variável equiprovável de um sistema ordenado. A teratologia, ou ciência dos monstros, por outro lado, se funda no princípio da “desmesura”. Ao descrever monstros sempre referimos que são excedentes ou excessivos, com dimensões enormes ou diminutas: gigantes, centauros, anões, gnomos, etc., que lhe faltam partes ou tem apêndices gratuitos, como os gastópodes, isquiópodes, etc.. A perfeição natural parece tender para a medida média e tudo que se apresenta como ultrapassando os seus limites é “imperfeito”, “monstruoso”.

Na mitologia clássica, por exemplo, o Minotauro e a Esfinge, protótipos de monstros, são ao mesmo tempo seres maravilhosos, amedrontadores e enigmáticos. Simultaneamente nos fazem experimentar fascínio e pavor.


FRACTAIS COMO UMA JANELA MÍSTICA PARA O INFINITO


Infinito. Imortalidade. A idéia de que não é absurdo fazer referência a algo que esteja além da nossa compreensão, uma coisa que transcenda totalmente a nossa existência, mesmo que seja algo tão simples quanto uma única linha de código numérico. Isto é o que me fascina mais do que tudo. Essa é a razão da minha paixão pela Geometria Fractal.. Contemplando uma figura fractal podemos nos surpreender encantados com sua estrutura e colorido, e, ao mesmo tempo, experimentar uma inquietação da mente, pela sua complexidade incompreensível, pelo seu desenvolvimento irregular e imprevisível, obrigando a um reajuste de nossa perspectiva e do julgamento e percepção do olho, para nos situarmos frente a um diferente, instável e angustiante fenômeno visual.

A beleza é uma das faces de Deus que, ao mesmo tempo em que se revela ao ser humano, convoca este mesmo ser humano para que a descubra, revele e comunique com recursos e palavras e traços humanos. Se a beleza, portanto, está em perpétua sintonia com o divino, também e não menos esta mesma beleza está presente entre os humanos enquanto caminho de experiência e descoberta da Verdade e da nomeação desta Verdade que, como diz o grande teólogo Karl Rahner, "nós chamamos a Verdade de Deus". A frase de Rodin que pomos em epígrafe nesse texto nos conduz, portanto, diretamente ao centro do tema de nossa reflexão: a relação entre mística e beleza, entre a Divindade e a Matemática. Se a fé nos diz que Deus é a Verdade, a experiência humana ao longo dos séculos e milênios tem nos revelado que a Matemática é bela, ou que o belo é o verdadeiro. Matemática, Beleza e Verdade na verdade são outros nomes para o Deus que as diversas religiões vêm nomeando ao longo dos tempos, experimentando em suas vidas e vendo-se por Ela fascinadas.

Contemplar a Deus, experimentar sua presença tem sido descrito com palavras e imagens e metáforas muito próximas daquelas utilizadas para descrever a experiência estética. A mística tem, portanto, inegavelmente, uma dimensão estética. Uma reflexão teológica sobre a beleza, portanto, deve levar em conta não apenas critérios categoriais e terminológicos, mas sobretudo estilos ligados à uma percepção do mundo mais direta do que a que usualmente as ciências e a mídia nos apresentam hoje, quando tudo é mediado, digerido. A pergunta que guia nossa reflexão, ao pensar sobre a beleza das estruturas fractais em ligação com o sagrado, é: de que estética e de que beleza se trata? Certamente não da beleza dos padrões ditados pelos parâmetros usuais, construídos pela mídia ao mesmo tempo em que são desconstruídos pelos interesses econômicos e comportamentais do instante em uma volatilidade que chega a ser surpreendente se não fosse melancólica. A beleza do divino é desconcertante e imprevisível, apresentando-se freqüentemente com visibilidade e signo invertido e paradoxal, deixando aquele ou aquela que a experimenta perplexo e fascinado, buscando captar a direção que lhe é mostrada com tal experiência.

Muito tempo atrás, fiz o download de um programa de geração de músicas fractais. O meu favorito atualmente é o Fractmus 2000, enquanto trabalho utilizando esse programa inevitavelmente encontro algo interessante e parece sou transferido para o mundo digital. Quando vejo algo de extraordinário em uma imagem fractal, o sentimento que tenho é que não a possuo individualmente, mas que apenas tenho a oportunidade de revelar publicamente o que já é um patrimônio de toda a humanidade. Veja bem, os números sempre estiveram lá. A Matemática dos fractais sempre esteve conosco, nós é que éramos incapazes de conhecê-la totalmente até a construção do primeiro computador. Mesmo assim ainda existem muitas pessoas que pensam: "Bom, eu vi esse fractal interessante, meu computador processou a imagem, é o meu fractal!". Minha opinião é que, mesmo depois de completamente renderizado pelo computador, o fractal não deveria ser objeto de direitos autorais. È um bem da coletividade, o explorador apenas topou com a imagem afortunadamente. Não me sinto confortável para alegar sua autoria..

A exploração das características dos fractais é uma jornada da qual participo, onde não sou o criador da imagem, mas apenas um observador, um fotógrafo que encontra algo fantástico e tira apenas um retrato. A minha teoria é, portanto, que o enriquecimento espiritual verdadeiro só pode ser obtido pela análise e exploração introspectiva de padrões de imagens fractais. Pense nisso, o que pode ser mais verdadeiro e sagrado do que os fundamentos axiomáticos da Matematica?

Sabemos que podemos somar e multiplicar, subtrair e dividir infinitas formas materiais ou conceituais, e não são exatamente essas leis fundamentais que, ao se entrelaçarem, configuram o próprio sentido da realidade em sua completude?

Podemos observar em primeira mão os princípios de polaridade sendo postos à prova na Geometria Fractal, não em oposição, mas em complementaridade. Esse é um conceito que certas culturas orientais já reconheceram há milhares de anos e a harmonia dessa configuração conceitual me inspira constantemente a trabalhar na criação dessas intrincadas obras de arte caótica.. Através do estudo dos fractais, acredito que podemos compreende melhor o nosso estado de existência no mundo dos fenômenos físicos, no qual a idéia de infinitude pode ser adequadamente investigada e cultuada, existindo além da fronteira de nossas mentes. Alguns pensadores questionam o conceito do Infinito. Afinal das contas, não é possível provar sua existência porque é algo totalmente inalcançável para qualquer indivíduo. Mas veja sobre esse ângulo: talvez recursivamente, gerações após gerações de indivíduos, finalmente consiga-se realizar essa tarefa. Sob essa perspectiva, assim como no conjunto de Mandelbrot onde a mesma imagem é contida em segmentos muito menores de si mesma, poderia estar ocorrendo algo semelhante com os organismos vivos? Foi assim que os fractais abriram meus olhos para a unicidade da raça humana. Continuaremos perpetuamente em um loop fractal? Poderiamos mudar, evoluir aprender, recursivamente, geração após geração, ganhando cada vez maior complexidade..

No final, cada um de nós é uma pessoa, um organismo inédito e autentico, enquanto parte de uma totalidade -- a vida.

Mas a vida é matemática, ou a Matemática está na vida? De qualquer forma, eis um objeto fractal, que existe de verdade, e é uma estrutura natural. A maneira com que ele cresce é idêntica a desenhos gerados por computador, o que indica que o mesmo tipo de informação e, porque não, programa está contido em ambos. Não deveria surpreender ninguém que as formas e as funcionalidades se repitam na natureza. De tudo que somos capazes de fazer com nosso complexo cérebro, pouca coisa é realmente original. As outras espécies já fizeram projetos bem ordenados e complexos, tais como a casa do joão-de-barro, a teia da aranha, etc... As coisas que podemos fazer não são exatamente mais complexas, são apenas mais rápidas, e por isso podem ser maiores ou mais direcionadas, mas a base continua a mesma. É muito difícil dizer onde surge algo realmente novo ou original na natureza... De certa maneira, nada é novo, porque todo arranjo é único, porém é só mais um arranjo possível. Essa coisa de ser único e ser só mais um é difícil de aceitar. Nós queremos ser mais que especiais, queremos ser especialmente especiais

Uma visão fractal da vida é muito interessante, e muito complexa. Trata-se de uma continuidade que não apenas não é linear, como é infinitamente reincidente e coincidente. Há infinitos graus entre uma coisa e outra, e cada uma das estruturas possíveis no mundo irá se repetir em um desses graus. Isso quer dizer que podemos todos ser uma parte de um fractal gigante e dinâmico. O universo está inteiramente contido em cada parte, tudo que muda é como encaramos essa parte. A forma com que olhamos para algo determina se vamos ver um padrão ou não. Nossa mente não passa de um arranjo possível. Ela repete os outros arranjos dentro dela, como qualquer fractal. Mas se a vida é fractal, todas as coisas repetem todos os padrões dentro delas, é só uma questão de observar na aproximação adequada. Isso não significa que só porque tudo esteja em tudo, tudo está em tudo de qualquer jeito, e tudo seja tudo logo nenhuma relação especial importa, pois são todas válidas. Existe um motivo do que porque enxergarmos algumas coisas como padrões e outras como caos. Pois apesar de tudo ser um grande padrão repetitivo, como pedaços desse padrão só podemos atingir uma faixa limitada do espectro. Todas as barreiras e as definições são ilusórias, não estão nas coisas, mas em nós. No entanto esses limites são úteis. Não é só porque algo é uma ficção que não seja útil. Num mundo fractal, tudo é ficção. A verdade é grande demais para ter algum significado.

Estamos vivendo num sonho, mas isso não implica em acordar. Nossos sonhos têm conteúdos que tem valor, enquanto sonhos. Eles têm sentido, não poderia haver outra forma de sentido que não fosse assim, imaginado. Somos imagens fractais se desenrolando, se manifestando. Agora, multiplique isso infinitas vezes, iterativamente, para ter apenas um leve vislumbre de como poderia ser o ritmo de desenvolvimento da nossa espécie se todo mundo se dedicasse a essas atividades..